Descrição: Em uma perspectiva que compreende como papel do Estado assegurar dignidade humana, justiça social e condições concretas de exercício de cidadania, as políticas públicas podem ser entendidas como um conjunto de medidas, ações e processos formulados e implementados com vistas à promoção e garantia de direitos conquistados socialmente. Nessa compreensão, espera-se que também as políticas públicas de saúde mental sejam orientadas para a vivência de percursos de cidadania, o que envolve não apenas a promoção de direitos – incluindo o direito ao cuidado em liberdade –, mas também o enfrentamento de iniquidades sociais que são barreiras para uma existência digna e em condições de igualdade e participação social. Tais medidas, ações e processos não estão dados a priori – ao contrário, são construídos por diferentes atores e forças sociais em um cenário de disputas, conflitos e contradições.
No cenário brasileiro, a promulgação da Constituição em 1988, representou um marco histórico das lutas pela redemocratização e em defesa dos direitos. Nos anos seguintes, no contexto do SUS, teve início a construção da política nacional de saúde mental, álcool e outras pautada nos princípios e diretrizes da reforma psiquiátrica e da luta antimanicomial de superação do modelo asilar e de garantia dos direitos de cidadania. Ao longo de mais de duas décadas, o percurso de implementação desta política, com ampla participação de diversos atores, em particular de pessoas usuárias e familiares, nas quatro Conferências Nacionais, sendo a última Intersetorial, com um conjunto de normativas e ações orientadas para superação de hospitais psiquiátricos, desinstitucionalização, criação e regulamentação de diversos serviços substitutivos, articulação intra e intersetoriais e, especialmente, a promulgação das Leis 10216/2001 e 10.708/2003, e a expansão das experiências locais propiciaram, não obstante diversos desafios e necessidades de avanços, um novo panorama da atenção em saúde mental no SUS com redes substitutivas e territoriais de atenção psicossocial promotoras de cuidado em liberdade, garantia de direitos, e de uma nova cultura de interagir e conviver nas cidades. Entretanto, desde 2016, verifica-se grave retrocesso desta política, no contexto de desmonte de políticas públicas que visavam à garantia de direitos e ao enfrentamento das desigualdades sociais, e das crises sanitária, econômica, social e política; por outro lado, destacaram-se múltiplas formas de resistência, cabendo ressaltar, no período recente, a mobilização e atividades preparatórias rumo à 5ª Conferência Nacional de Saúde Mental prevista para maio de 2023.
Justamente, a invenção e a construção de políticas públicas envolvem desafios diversos e seus limites e possibilidades de avanço se relacionam diretamente ao contexto sociopolítico em vigor. Nesse sentido, pensar sobre uma agenda de políticas públicas de saúde mental fundamentada na garantia de direitos envolve refletir sobre a conjuntura social, política e econômica e o que esta conjuntura cria de condições e desafios para o desenho e desenvolvimento de políticas públicas. Indo além e considerando que é preciso assegurar por meio de políticas públicas direitos já conquistados, mas, também, responder a problemas estruturais antes não devidamente reconhecidos, como o racismo, e que impactam também a saúde mental, é fundamental abrir diálogos para inventar novos direitos e políticas públicas.
Tendo essas questões em vista, o evento buscará discutir e dialogar a partir da intervenção de conferencista sobre os desafios e horizontes atuais na formulação e implementação de políticas públicas promotoras de direitos humanos na conjuntura latino-americana a partir de uma perspectiva reflexiva e crítica. Na sequência, buscará refletir com os participantes sobre o desafio do enfrentamento da iniquidade social para garantia de direitos em saúde mental. Embalada por essas reflexões, no período da tarde o evento irá propor no formato de uma mesa redonda a reflexão e discussão sobre políticas públicas fundamentadas nos direitos humanos e em uma perspectiva decolonial que abranjam a compreensão da diversidade e a necessidade de enfrentamento de racismos.
Diversidade, preconceito e racismo(s): decolonialidade, direitos humanos e políticas públicas
Apresentação:
Bruno Sena Martins (Universidade de Coimbra) e Eunice Prudente (Universidade de São Paulo)
Debatedor:
Luis Eduardo Batista (Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo)
Encerramento
Sonia Barros (Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Políticas Públicas e Saúde Mental do Instituto de Estudos Avançados da USP)
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=-pDZ-vt6eXk
Fonte: IEA/USP